"Toda
vez que eu olho em seus olhos... Eu sinto que eu poderia olhar neles durante
toda a vida... Podemos começar pela vida... Hoje à noite... Para a
vida..."
Get It Started - Shakira e Pitbull
-Tu estás
bem? – João perguntou durante o café da manhã no dia seguinte.
-Claro –
esbocei um sorriso.
-Está tão
quieta, tu não é assim, filha. Como foi a tarde com os Ávila? – ele tinha que
cutucar a ferida ainda exposta, não é?
-Dona Luíza
e a Jessy me receberam super bem. Elas são uma graça e foi uma tarde muito
agradável, mas agora preciso ir, pai. Não quero chegar atrasada.
-Não
esqueça a trava no jipe, ok? – sorri, beijando seu rosto. Ele havia me falado
dessa bendita trava desde a hora do jantar na noite anterior.
-E o senhor
venha almoçar em casa. Coloquei seu almoço separado na geladeira, é só
esquentar.
-Sim,
senhora. – sorrimos e acenei para ele pegando minhas coisas e saindo para
garagem, mas meu celular tocou e precisei jogar tudo no capô do jipe, como toda
bagunceira e desorganizada faria.
-Alô – nem
olhei o visor.
-Bia – era
a Jessy. Respirei fundo lembrando que tínhamos trocado nossos números de
celular no dia anterior.
-Oi, Jessy.
Bom dia – ela não tinha culpa do irmão que Deus lhe deu.
-Eu queria
pedir desculpas, nem dormi a noite.
-Não se
preocupe, está tudo bem – fui sincera. Eu já gostava muito dela.
-Mas mesmo
assim, me perdoe por ele – meu coração gelou. – O Léo...
-Vamos
fazer o seguinte, pare de bobeira e me espere no estacionamento. Estou chegando,
lá a gente conversa melhor.
-Estou
esperando já – sorri do desespero da minha amiga.
-Eu juro
que está tudo bem.
-Então vem
logo, que os trotes ainda não acabaram.
-Estou
chegando para nos salvar, acho que posso atropelar uns três com meu jipe, o que
acha?
-Seu pai irá ter um bocado de
trabalho se isso acontecer – sorrimos e desliguei.
Precisava
encarar esse problema de frente, mesmo que ele tivesse um metro e oitenta e
cinco e um sorriso de matar qualquer um.
Eu seria
forte.
Cheguei à
Federal e a movimentação de bichos e veteranos ainda era grande. Assim que
parei meu carro no estacionamento todos me olharam, e eu detestava ser o centro
das atenções.
-Bonito
jipe, guria? Que ano que é? – um dos caras perguntou.
-Setenta e
sete – respondi tímida.
-Parabéns.
-Obrigada.
Assim que
avistei Jessy corri até ela, não antes de passar a tal trava no carro.
-Bom dia.
-Bom dia,
amiga – ela mantinha a cabeça baixa.
-Jessianny,
– ergui seu rosto – já disse que está tudo bem – sorri para ela.
-Mas tu não
merecias passar por aquilo ontem, eu quase o matei – revirei os olhos
imaginando a guerra que foi na fazenda. Seu Flávio já não estava muito feliz
com a pessoa, depois do que ele fez então.
-Não
precisa se desculpar.
-Mas eu
preciso – congelei ao ouvir aquela voz tão perto de mim.
-Leonardo,
não complica as coisas – sua irmã foi a primeira a falar, o que dei graças a
Deus, pois estava completamente muda e sem coragem para me virar.
-Eu preciso
conversar contigo, Maria Beatriz – num supetão respirei fundo e virei.
-Não temos
nada para conversar – não olhei no seu rosto.
-Bia – ele
gaguejou – eu...
-Olha,
estamos atrasadas – encontrei forças para mover minhas pernas, mas depois de
três passos, Léo me puxou pelo braço.
-Leonardo –
Jessy ralhou.
-Isso é seu
– tirou nossas fotos da carteira.
-Eu não
quero mais. Fica com elas. Quem sabe consiga encontrar esse cara que tirou as
fotos comigo em algum lugar – apontei para a seqüência de retratos em suas
mãos.
-Mas,
Bia...
-Até mais,
Leonardo. Vamos, Jessy?
-Vamos. E
tu fiques longe da gente – pela primeira vez naquela manhã consegui olhar nos
seus olhos e pude ver arrependimento. Porém eu ainda estava muito decepcionada.
Não era por um cara desses que queria me apaixonar, então acho que o
descontentamento era mais comigo do que com ele. E por isso, a melhor coisa a
fazer era me afastar.
A semana
seguiu arrastada. Eu e Jessy estávamos cada vez mais juntas e o assunto do
curral havia sido parcialmente esquecido.
É claro que
Léo ainda me perseguia, mesmo que fosse com os olhos, durante todo o tempo que
passávamos juntos na faculdade, mas com isso eu poderia lidar. O que não
conseguiria era vê-lo tão perto. E isso Jessy já tinha resolvido, o avisando
para se manter longe de nós.
Cheguei na
sexta feira e desde o estacionamento vi uma movimentação em volta de Leonardo e
seu amigo, André. O amor platônico, eu tinha certeza, de Jessy.
-O que
estais acontecendo ali? – perguntei cutucando minha amiga, que já me esperava.
-Todos
estão comprando o convite da festa da república.
-Festa da
república? – repeti confusa.
-É a festa
para os bichos que tem todos os anos, o Léo e os meninos organizam.
-E por que
tu não me falaste isso antes? Nós somos bichos, vamos assim dizer – pisquei
para ela, rindo.
-Porque o
Léo nunca me deixa ir às festas das repúblicas. Ele diz que não é lugar de
mulher lá.
– O quê? -
Estava pasma com aquele machismo. Mais um ponto negativo para seu caderninho
negro, Leonardo Ávila.
- E tu tens
vontade de ir, não é? – eu sabia ser diabólica quando queria.
-Eu sempre
quis ir! – ela olhou para André, apaixonada.
-Posso te
fazer uma pergunta? – ela voltou a olhar para mim, intrigada.
-Claro,
Bia.
-Tu gostas
dele? – apontei para o loirinho.
-Está tão
na cara assim? – tinha conseguido deixá-la envergonhada.
-Não. É
que... Na verdade, acho que pelo nosso curso, eu observo muito as pessoas e vi
que você o olha diferente desde o primeiro dia de aula.
-Eu me
apaixonei pelo André desde quando ele chegou aqui em Santa Maria, Bia. Mas sendo
a irmã do “chefe” da organização, – ela fez aspas com as mãos – você sabe...
Ninguém me olha desse jeito.
-Eu vou te
ajudar.
-Como? –
foi sua vez de ficar confusa.
-Nós vamos
a essa festa.
-Acho que
isso não é uma boa, Bia – Jessy fez uma careta.
-É claro
que é. Lá tu poderás ter mais chance de conversar com o André.
-Como? O Léo me mata se aparecer nessa festa.
-Do seu
irmão cuido eu, confia em mim – eu iria cutucar a fera. Mas não o deixaria
abrir a boca com a irmã. O problema dele seria comigo. E ali Leonardo
conheceria a outra faceta, ainda escondida de Maria Beatriz Albuquerque. –
Precisamos comprar os convites com outra pessoa, quem mais está vendendo?
-Não sei
não, Bia.
-Confia em
mim, amiga. Seus pais não vão se importar, tenho certeza.
-Isso eu
sei. O Léo é bem mais possessivo que eles – sorri maquiavélica.
-Então
vamos lá – ela apontou para um menino que também vendia os convites, então
fomos até ele já comprando os nossos para a festa do dia seguinte.
Leonardo
que me aguardasse. Eu transformaria sua vida em um inferno bem quente.
...
-Vocês
estão muito bonitas – João nos observava da porta, enquanto terminava de
maquiar Jessy, que já estava pronta.
Havia
escolhido um vestido tomara que caia curto, colado ao corpo, com uma cor marrom
e vermelha, mesclada. Cabelos soltos, salto alto, maquiagem leve e minhas
inseparáveis lentes de contato.
Sim, eu queria causar.
Já para
Jessy, compramos um preto de alça mais larga, porém não menos curto que o meu.
Prontas,
rumamos para o jipe com João nos dando o sermão de sempre.
“Não beba, você está dirigindo”.
“Não aceite bebida de estranhos”.
“Coloque a trava no carro, e o
estacione em um lugar seguro”.
Devidamente
avisadas, fomos para a festa e chegando lá percebemos que a república já estava
explodindo de gente.
Estacionei
ao lado da casa, mas quando desci já reparei que alguns meninos que estavam na
porta nos olhavam maliciosamente.
Era isso que queria. Ser percebida
para cutucar certo peão garanhão e ignorante.
-Nossa! Está todo mundo olhando para a gente – Jessy
falou enquanto entrávamos na casa. Porém apenas um olhar me interessava e esse
pousou em nós como uma águia, deixando as meninas que o paparicavam falando
sozinhas.
-O que
vocês estão fazendo aqui? – Leonardo chegou enfurecido.
-O mesmo
que tu, nos divertindo – dei de ombros, tentando passar por ele, carregando
Jessianny comigo.
-Esse lugar
não é para meninas! – ele olhou para a irmã e meus olhos caíram como fogo sobre
as meninas que estavam com ele, minutos atrás.
-E o que
seria aquilo ali– apontei para as vadias – vacas para seu experimento do
laboratório de veterinária? – dei as costas saindo, mas antes virei novamente e
o encarando, completei. – Largue do pé da sua irmã, seus pais sabem que ela
está aqui comigo. Então, deixe-a em paz – e antes que ele abrisse a boca, virei
novamente e saí.
Eu queria
muito provocá-lo, deixar o peão a ponto de bala, mas comigo e não com a irmã,
que só queria se divertir e quem sabe ter sorte com o loirinho.
-Adoro o
jeito que você enfrenta o Léo, amiga. É de uma mulher assim que ele precisa,
que consiga deixá-lo de quatro e sem reação, como agora.
-Você não
está desejando ser minha cunhada, não é?
Isso está completamente fora de cogitação!
-Que pena!
Mas vamos nos divertir – vi a decepção em sua voz. Mas estava mesmo
determinada. Não queria me envolver com um cara assim, nunca! Tá, a quem estava tentando enganar?
Balancei a cabeça, negando esse sentimento.
-É assim
que se fala! Olhe ali seu loirinho no
bar, vai lá que fico de olho no brutamonte do seu irmão, mas o leve para fora
da vista dele, não sei se conseguirei segurá-lo.
-Ai, será
que isso vai dar certo, Bia? – Jessy estava tímida.
-Claro que
vai, confie em mim – empurrei-a sorrindo e fui para o outro lado do bar
improvisado. De onde ficaria de olho em Leonardo, para que ele não estragasse a
noite da irmã.
Eu estava
ali para ajudar minha amiga, mas também poderia me divertir um pouco, principalmente da cara furiosa do seu irmão.
Resolvi
pegar uma bebida e dançar um pouco na pista, também improvisada. Daria vida a
Maria Beatriz de São Paulo, não tão pacata e muito mais animada.
Era o que
eu fazia lá, já que em casa com Maria Elisa sempre foi insuportável ficar.
Eu tinha
alguns amigos, já que saia bastante, não que isso me fizesse experiente, muito
pelo contrário. Mas me fazia feliz, momentaneamente.
Conversei
com algumas pessoas que já conhecia da faculdade, algumas meninas que não eram
tão vacas assim e os meninos da minha turma.
Estava me
divertindo quando fui puxada para a pista de dança, sempre com um olho em
Jessy, que havia engatado uma conversa com André no fundo da casa e o outro em
Leonardo, que na verdade, não tirava os olhos de mim.
Em certo
momento da noite, depois de duas cervejas e uma dose de vodca, senti mãos
apertarem minha cintura, enquanto dançava uma música da Shakira e Pitbull, mas quando tentei me virar para xingar, senti
seu perfume.
-Tu estás
linda, sabia? – sussurrou em meu ouvido, com nossos corpos colados.
-Você não
deveria chegar tão perto – tentei parecer dura, mas estava derretida nos braços
de Leonardo. Acho que a mistura do álcool no meu sangue e a música quente
tocando, não estavam ajudando para meu plano inicial, que era me manter longe
dele.
-Será que
podemos dar uma trégua hoje? – continuou sussurrando no meu ouvido.
-Preciso
sentar – virei e me perdi na imensidão de seus olhos verdes e aquele sorriso
aberto.
-Vem – ele
me puxou para a varanda da república, colocando seu chapéu.
-O que você
quer? – estava de pé, com as costas para ele, pois bebida e Leonardo tão perto
não ia prestar.
-Te pedir
desculpas pelo que fiz aquele dia no curral. Eu fui um grosso.
-Foi mesmo!
-Bia, eu
queria começar de novo e te mostrar, – ele me virou delicadamente, fazendo com
que nossos olhos se cruzassem – que esse cara aqui existe – apontou para nossas
fotos em suas mãos.
-Eu sei que
ele existe, só não sabia que ele era tão arrogante também.
-Desculpa,
Bia. Eu sou assim – Léo tirou o chapéu, mexendo nos cabelos e percebi que
estava nervoso.
-Como quando
fala que essa festa não é para meninas? – tentei sair de perto do seu corpo,
mas estávamos muito perto, espremidos na sacada pequena.
-Não foi
isso que quis dizer. Na verdade vocês são diferentes.
-Mas,
também nos divertimos, a Jessy tem o mesmo direito que você– tentei não me
colocar em um patamar tão próximo dele, pois não era nada sua, ou era?
-Eu só me
preocupo – ele estava sendo sincero.
-Então não
a sufoque.
-Eu vou
tentar – saiu um pouco de perto de mim, encostando-se na sacada. –Você se importa
de eu fumar?
-Desde que
possa dividir comigo – Léo me olhou ressabiado.
-Então a
marrentinha fuma?
-Bebe e se
diverte. Esse é um dos meus segredos e vícios. Minha mãe sempre fumou e quando
me mudei para São Paulo não resisti – ele acendeu o cigarro, dando o primeiro
trago, me tirando o ar. Como poderia ser tão sensual?
-Tu me
perdoas? – passou o cigarro para mim e quando nossas mãos se tocaram meu
coração disparou.
-Você sabia
que não encontrei só vacas aqui? – rimos juntos com minha troca de assunto.
-E por
falar em vacas, a Mimosa... Você ajudou muito aquele dia. Ela ficou mais calma
e pude fazer o parto sozinho – sorri feliz por sua constatação. – Até pesquisei
a noite sobre isso, a Jessianny me falou do congresso.
-Que bom,
fico feliz.
-Por isso
queria te pedir desculpas.
-Tudo bem,
já passou. Então tu pesquisaste?
-Pesquisei
e queria te convidar para me ajudar mais vezes – estava realmente surpresa.
-Ta – foi
só o que consegui dizer.
- Está
linda hoje. Adoro seu cabelo solto – acariciou meus cabelos carinhosamente e
percebi que aquela era a hora de ir embora.
-Eu preciso
ir – me desvencilhei do seu olhar.
-Ainda é
cedo – tocou meu rosto. Mas não queria cair nos encantos de uma noite qualquer
com ele.
-Mas eu
preciso. Amanhã acordo cedo – menti. - Tu me faz um favor?
-O que
quiser – nossas bocas estavam tão próximas, nossos corpos colados e mais um
minuto ali faria uma besteira.
-Leve sua
irmã para casa e não brigue com ela, por favor. Se eu descobrir que você gritou
com a Jessy por causa dessa festa nós nunca mais conversaremos.
-Ok! Eu
entendi e não vou brigar com ela, Bia. E... Eu entendo que vocês também querem
se divertir. Foi uma noite gostosa, adorei sua companhia – ele estava tentando
me passar uma cantada?
-Eu tenho que
ir... Mesmo – sai da sacada com Léo me acompanhando.
-Te levo
até o carro – respirei fundo e ele me seguiu com a mão na minha cintura. –
Melhor proteger isso aqui. Todo mundo só teve olhos para sua bunda hoje –
estava espantada com sua mudança brusca de humor. Será que ele estava com
ciúmes? Ri internamente.
-Nem
percebi.
-Sim, tu
percebeste, guria – paramos na frente do jipe. – Belo carro. Eu sou louco por
jipe.
-Para quem
tem uma caminhonete, um jipe não é nada – provoquei, rindo.
-Mas sonho
não tem a ver com tamanho – Leonardo tinha o dom de me pegar desprevenida.
-A gente se
vê, Léo – abri o carro, mas ele foi mais rápido e me puxou para ele.
-A gente se
vê, marrentinha – beijou meu rosto bem perto da boca e se afastou.
Liguei o
carro, mas antes que me esquecesse avisei a Jessy que tinha ido embora e que
Léo a levaria. E pedi para disfarçar, caso estivesse acontecendo algo de mais
interessante entre ela e André.
Andando
pelas ruas desertas de Santa Maria pensei em como pude ser tão burra. Fui para
aquela festa com o intuito de irritar ainda mais Leonardo e sai de lá
suspirando, apaixonadamente.
Droga! Eu o
queria mais que a mim mesma. Mas como lidar com sua petulância?
Lembrei
então das palavras da sua irmã no começo da festa... “É de uma mulher assim que ele precisa, que o deixe de quatro e sem
reação, como agora.”
Cheguei em casa tentando não fazer
barulho, mas mesmo assim João resmungou do seu quarto, perguntando como havia
sido a festa. Troquei duas palavras com ele e fui para meu quarto, tirando
minha foto e do Léo de dentro da bolsa.
Ele havia
sido o mesmo do dia da quermesse e isso estava me matando, principalmente por
não saber o que pensar em relação a Leonardo.
Dormi
agarrada a Bartolomeu, que estava esquecido no canto do quarto desde segunda
feira e mais uma vez sonhei com ele. Meu peão garanhão.
Gostei muito mas a Bia cedeu muito depressa! Você é diva um beijo
ResponderExcluir