quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Léo e Bia... Capítulo 21

                                     

Capítulo 21 – Amor incondicional
"Basta um cheiro ou apenas um sorriso... Pra eu perder meu ar e o juízo... Seu domínio em mim é fatal... Eu me sinto tão irracional... Mas não tem jeito é assim... Nunca vai mudar, vou me declarar... Com rosas... Perfume, uma declaração... Com beijos... Canções de amor, um violão... Quer saber por que, eu amo você... Quero sempre te surpreender..."
Marcus e Belutti – Irracional

            -Tem certeza que não queres ir de cadeira? – Léo estava de pé na porta do meu quarto do hospital, me esperando para irmos ver o Boi.
            -Tenho, amor – ele beijou minha testa. – Será que dá para parares de ser tão paternalista comigo. Para isso eu já tenho o João – Léo fez com que parasse na frente dele, erguendo meu rosto.
            -Maria Beatriz... – balançou a cabeça. – Tu não faz ideia de como a última coisa que quero nesse momento é ser seu pai – me prensou na parede.
            -Então me beija de verdade – ofereci minha boca.
            -Esqueceu que estamos em um hospital e com a porta aberta?
            -Por isso não – o puxei para mim, fechando a porta atrás de nós.
            -Tu és danada, marrentinha – pegou minha nuca juntando nossas bocas com voracidade, porém perdi o fôlego mais cedo que esperava o empurrando, engasgada. – Pequena, está tudo bem?
            -Está – comecei a andar de um lado para o outro em busca de ar.
            -O médico disse que isso ainda vai acontecer durante algum tempo.
            -Eu sei – voltei a olhar seu rosto lindo, que sorria, mesmo com o semblante preocupado. – Desculpa.
            -Pelo quê?  Me provocares? – tocou meu rosto e rimos juntos. – Sabes que o cigarro está eliminado de nossas vidas, não é?
            -Sei – repeti seu gesto com carinho. – Nós prometemos que se um dia fossemos parar, o faríamos juntos.
            -Juntos. Como tudo na vida – entrelaçamos nossas mãos.
            -Sim – respirei fundo e Léo me deu um selinho.
            -Desculpa, pequena, mas tive tanto medo de te perder que agora penso que vai quebrar.
            -Estou frágil, mas nem tanto, amor. Vou melhorar – disse confiante.
            -Já melhorou, linda. Está até brigando comigo – ri, batendo de leve no seu braço.  – Tua mãe também parou de fumar, ela te contou?
            -Contou. Depois que o médico saiu ontem. Ela nos surpreendeu, não é, amor?
            -Tu que nos surpreendeste com esse enorme coração, Bia – tocou meu peito. – Nós percebemos o arrependimento sincero dela, mas era de ti que  o perdão tinha que vir e ele veio na mesma hora – me abraçou quando percebeu que meus olhos estavam cheio de lágrimas.
            -Ela é minha mãe.
            -Sim e tu agora estás completa.
            -Só me falta  uma coisa... – Léo olhou confuso – precisamos acordar o Boi – ele riu fracamente. Ali percebi como Léo sentia falta do melhor amigo e principalmente, como devia ter sido complicado todos esses dias comigo em coma também.
            -Tu tens razão. Vamos lá?
            -Vamos.
            -Sabes que me arrependo de não ter dito para o Boi te levar de volta à fazenda para cantar para a Mimosa. Teríamos passado aquela noite rindo, tomando cerveja e implicando um com o outro, sem nada disso ter nos afetado tanto – Léo disse pensativo, enquanto caminhávamos devagar até a UTI.
-Mas daí ele não teria conhecido o amor da vida dele – apontei para Mirela que estava mais adiante.
-Eu iria atrás dela em qualquer outro lugar, – seus olhos estavam tristes – para que eu pudesse ver vocês dois bem.
-Eu sei, amor, mas não podemos voltar atrás e ele vai sair dessa também – apertei ainda mais nossas mãos juntas. – Será que ele tem noção que vai acordar namorando e já abençoado pela Zefa e o Padre Olavo? – rimos.
-Acho que é por isso que está demorando a acordar. Deve estar refletindo na vida.
-Leonardo! – ralhei, ganhando um beijo na boca.
-Estou brincando, pequena. Ele que não assuma essa menina que eu o obrigo a casar, igual fez comigo.
-Ele fez isso contigo? – estava surpresa.
-Depois de tudo que enchi o saco dele, era o mínimo que podia fazer – coçou a cabeça.
-Ela é uma graça, não é, amor?
-É, mas tímida demais, pequena – lembrei do dia da boate. – Fiquei sabendo que foste tu que apresentaste os dois.
-Aprendi contigo que ser amigo atrapalha na hora de paquerar.
-Me lembro bem desse dia.
-Eu também – ganhei mais um selinho.
-Bom dia, Mirela. – chegamos perto da nossa nova amiga e quase cunhada de consideração.
-Bom dia, Bia. Fico feliz em te ver bem – ela me abraçou, emocionada.
-Eu também fico feliz em ver você aqui. Minha flecha de cupido acertou em cheio, amor – Mirela corou violentamente.
-Essa minha marrentinha é fogo – Léo me abraçou por trás, beijando meu ombro. – Tu vais ver, o senhor Luis Carlos vai levantar rapidinho daquela cama depois da visita da Maria Beatriz. Ela não vai deixá-lo em paz – bati no seu braço, brincando.
-Vamos entrar? – estava ansiosa.
-Vamos.
-A gente se fala depois, Mirela. Foi muito bom te ver.
-Tudo bem. Foi bom rever você também, Bia. Ele vai ficar feliz em ver que foi um herói. – nessa hora me lembrei novamente do dia da tragédia e que ela estava ao nosso lado.
-Como conseguiu sair?
-Quando o Boi gritou, assustei e me perdi de vocês .  Fui empurrada para fora, sendo uma das primeiras a sair.
-Que bom. Fico feliz.
-Agora vão, entrem para ele se levantar também.
-Deixa com a gente – sorrimos e seguimos até a porta do quarto que nos levaria ao nosso amigo. E foi ali que minha ficha caiu, principalmente quando, já dentro do UTI, vi Boi naquela cama cheio de aparelhos.
Era mais difícil que imaginava e entendi o que Léo tentava me dizer a pouco.
Também caçaria Mirela em qualquer outro lugar para não ter que estar naquele quarto vendo meu amigo lutando pela vida.
Nos aproximamos da cama e toquei sua mão.
-Oi – minha voz saiu embargada e senti Léo abraçar minha cintura, tentando unir nossas forças com aquele gesto. – Eu acordei primeiro, viu.
-E eu disse que se isso acontecesse estarias ferrado – a voz de Léo estava emocionada também.
-Está na hora de acordar, amigo – me aproximei do seu ouvido. – Preciso te agradecer. Tu salvaste minha vida, Boi.
-Saiba que eu o agradeço todos os dias – olhei para cima, tocando o rosto dos dois. – É claro, depois de brigar com ele.
-Claro – revirei os olhos, sorrindo. – Boi, que história é essa de deixar a menina que te ajudei a conquistar solta por aí?
-Disse para ele que ela vai cansar de esperar – fungou.
-Ela vai fugir isso sim e se prepare – sussurrei ainda abaixada perto do meu amigo – sua mãe e o padre Olavo já abençoaram vocês dois. E lembra o que aconteceu comigo e com seu amigo aqui.
-Tem jeito mais não. Até o pai da menina veio te visitar, ou ver se não tinha como fugir. Se for por isso que estás dormindo ainda, trate de acordar – Léo brincou.
-Viu só, não tem mais jeito de escapar, peão. – respirei cansada.
-Cara, vou levar minha garota de volta para o quarto. E preciso te contar, - levantei e foi a vez de Léo sussurrar no ouvido do seu irmão de uma vida inteira – acabou de acordar e já está me dando trabalho – sorri, balançando a cabeça  – Vamos?
-Sim.
Nos despedimos do nosso amigo e voltamos para meu quarto, dessa vez de cadeira de rodas. Descansei o resto do dia com Léo dizendo que deveria ter sido menos teimosa. Ali percebi que estávamos voltando ao normal, até em nossas brigas que amava tanto.
Completado um mês da tragédia, recebi alta. E enquanto minha mãe arrumava minha mala, assistia ela e João discutirem comigo.
-Filha, a igreja vai estar lotada.
-Pai, nós vamos chegar quase no fim. Podemos ficar na capela – implorava para ir à missa de um mês da tragédia na igreja do Padre Olavo.
-E você não diz nada? – Maria Elisa perguntou para Leonardo, que estava refestelado no sofá junto comigo, fazendo cafuné em meus cabelos.
-Olha, Dona Maria Elisa, - ele gostava de provocar a mãe, fazendo com que eu e João gargalhássemos todas às vezes – conheço essa marrenta aqui a bem menos tempo que vocês, tchê. Por isso sei que não adianta discutir com a bichinha – me apertou ainda mais a ele.
-Bia, a imprensa do mundo inteiro está na cidade ainda.
-Pai, cinco minutos. Eu quero rezar por nossos amigos – senti meu coração apertar lembrando todos aqueles que nós conhecíamos de vista, mas principalmente de Mauricio e Vinicius, meus colegas de classe, que morreram naquele dia. – Ainda não consigo acreditar que o Mauricio e o... – comecei a chorar sendo acalentada por eles.
-E a galera da agronomia, então. Porra! Desculpa, Delegado, mas é difícil perder amigos tão queridos.
-Vai ser complicado para vocês terem que conviver com essa tragédia daqui para frente, principalmente tendo feito parte integrante dela, por isso queremos preservá-los, filha – minha mãe disse carinhosa. – Têm fotos de vocês espalhadas por todos os cantos.
-Até a última que a Bia mandou para ti.
-Essa o senhor tinha que investigar – Léo se remexeu ao meu lado. – Queria saber como uma foto que estava no meu celular foi parar na imprensa.
-Deixa para lá, amor. O pai já tem tanta coisa na cabeça.
-Deve ter sido uma das vezes que abriu para alguém aqui no hospital, Léo.
-Pode ser – mas conhecia meu namorado e ele não tinha engolido essa história.
-Podemos ir então? – pedi juntando as mãos.
-Tem outro jeito? – beijei meu namorado.
-Não – dei de ombros.
-Léo entra com ela pela casa do Padre Olavo e fiquem na capela, atrás do altar.
-Pode deixar, Seu João.
-Vamos estar no carro de trás.
-Ok, dona Maria Elisa.
-Sem o dona, Leonardo, quantas vezes eu já te disse...  – rimos e saímos os quatro do hospital.
O sol estava a pino como há um ano, o dia da minha chegada a Santa Maria. Não sei se Léo recordava dessa data e isso não me importava, por saber que homem não ligava muito para essas coisas. Porém nunca poderia esquecer o dia em que conheci, ou melhor, dizendo, atropelei o amor da minha vida.
O dia mais feliz da minha vida.
O caminho até a igreja foi feito em um silêncio harmonioso, pois Léo sabia que eu estava adaptando meus olhos para a vida, depois de um mês inteiro dentro do hospital, depois de quase morrido.
Chegando lá, como instruído por João, ele entrou pelos fundos da igreja, ajudando-me a descer e chegar até a sacristia.
-Está tudo bem, pequena? – perguntou preocupado quando respirei fundo.
-Está, amor – toquei seu rosto, carinhosamente. – Só um pouco cansada.
-Quer voltar?
-Não. Vamos ficar só um pouquinho.
-Tudo bem, vem devagar. – Léo me levou até a capela e de lá podemos observar a igreja cheia, principalmente do lado de fora, com toda a imprensa ali.
Assistimos a benção final feita pelo Padre Olavo e aquelas palavras me emocionaram muito, mesmo começando a passar mal devido a quantidade de pessoas ao nosso redor. Acho que nunca mais conseguiria ficar em lugar fechado.
-Me dá uma dor no coração, amor, olhe aquelas mães – apontei. – Poderia ter sido a gente – solucei e ele me abraçou. – É uma sensação horrível.
-Eu sei, pequena – senti seu corpo estremecer também. – Shiu. Vai passar.
-Como pode ter acontecido isso com a gente?
-Não sei, pequena, ainda estão investigando.
-Filhos – Padre Olavo passou pela capela, nos vendo ali abraçados.
-Padre – me desvencilhei dos braços de Léo, indo a sua direção.
-Minha filha – abraçou-me, também emocionado. – Iria a tua casa hoje à noite.
-Eu quis vir, Padre – funguei.
-Eu sei, minha querida. Mas não pode se esforçar.
-Foi o que dissemos – olhamos para Léo.
-Vou ficar bem – estiquei a mão para que meu namorado pegasse.
-Vou dar atenção a algumas famílias, mas me espere que a noite estarei lá, Maria Beatriz – assenti e voltei para os braços de Léo.
-Até mais, Padre.
-Cuide dela, filho.
-Eu vou – ele beijou minha testa e saiu. – Bia, antes de irmos embora queria te dizer uma coisa – olhei confusa para seu rosto. – Algo que deveria ter feito há um mês.
-O que foi, Léo?
-Pequena, tu és a coisa mais especial da minha vida. Não, - balançou a cabeça - tu és a minha vida e percebi isso no momento em que te vi desfalecer nos meus braços sem que eu pudesse fazer nada. Naquele momento, Maria Beatriz, eu quis morrer, só para poder ficar perto de ti, voltando a respirar apenas quando o médico disse que tu estavas fora de perigo.
-Léo...
-Shiu – ele sorriu, tocando meus lábios com seu dedo. – Hoje é um dia muito especial para nós, amor – ele lembrou. Sorri, deitando a cabeça em sua mão. – Um ano que me atropelaste naquele aeroporto.
-Que nos atropelamos você quer dizer – as lágrimas recomeçaram a cair quando ele assentiu.
-A gente aprendeu que Deus escreve certo por linhas tortas, não é? Então acho que o dia teria que ser esse – Léo se ajoelhou diante de mim. – Fiz uma promessa aos pés do altar dessa igreja bem antes de toda essa tragédia e lá já pedi para que ficastes boa e hoje vendo que fui prontamente atendido, venho aqui cumpri-la, além de lhe fazer um pedido – respirei fundo. - Maria Beatriz Albuquerque, minha pequena marrenta – solucei extasiada. – Tu aceitas se casar comigo?
Estava sem fala, sentindo que minha respiração falharia a qualquer momento. Meu Deus! Era tudo que eu mais queria. Ser dele, para sempre.
-Léo... – me ajoelhei também, enquadrando seu rosto com minhas mãos. – Eu te amo tanto. Tu também és minha vida e tive a mesma sensação quando acordei do coma e não te vi ao meu lado. Quero ser sua para sempre – sorri em meio ao choro. - Sim, Leonardo Ávila, eu aceito me casar contigo – Léo beijou meus lábios levemente e nossos gostos salgados se misturaram ali, me fazendo perceber que não era a única que chorava.
-Sempre estarei aqui por ti.
-Eu sei – solucei. – E é isso que eu mais quero.
-Eu sei – repetiu sorrindo, me beijando novamente. Um beijou que deveria ser proibido em uma sacristia, mas quem se importava. Agarrei sua nuca, ali ajoelhada, me sentindo viva e completa para ser feliz ao lado do meu amor.
-Eu te amo – disse perdendo o ar, sendo levantada por ele.
-Eu também, mais que tudo, pequena. Quero me casar contigo. Ter teu corpo colado ao meu todas as noites, – me abraçou – poder sentir sua respiração em meu peito todas as manhãs – beijou meus cabelos – Comprar nossa casa, construir nossa vida.
-Nós temos uma casa, Léo – beijei seu pescoço.
-A nossa cabana.
-É – tocou meu rosto com o polegar.
-Mas eu quero te dar mais, pequena. Quem sabe um apartamento.
-E o nosso lugar? – fiz biquinho.
-Ele será nosso, para sempre.
-Nossa casa de final de semana?
-E para quando quisermos variar – piscou sacana.
-Leonardo! – ralhei - Estamos em uma igreja.
-Por isso vejo que já é hora de irmos embora.
-Também acho, senhor meu noivo – ele me pegou no colo, girando nossos corpos. – Para, Léo, vou perder o ar – logo fui colocada no chão.
-Tu estás bem? – me sacudiu.
-Estou – sorri – e o beijei levemente. – Vamos que o senhor tem uma missão agora – o puxei.
-O quê?
-Pedir minha mão para meu pai e minha mãe.
-Isso vai ser moleza, principalmente para a Dona Maria – rimos, entrelaçando nossas mãos. Mas quando estávamos próximos do carro, João nos gritou, pedindo para esperar.
-Você precisa voltar para o hospital, Léo.
-O que aconteceu, pai? – senti meu corpo inteiro gelar.
-O Boi acordou.

Naquele momento nossa alegria estava completa.

Um comentário: