Capítulo 21 – Amor incondicional
"Basta
um cheiro ou apenas um sorriso... Pra eu perder meu ar e o juízo... Seu domínio
em mim é fatal... Eu me sinto tão irracional... Mas não tem jeito é assim...
Nunca vai mudar, vou me declarar... Com rosas... Perfume, uma declaração... Com
beijos... Canções de amor, um violão... Quer saber por que, eu amo você...
Quero sempre te surpreender..."
Marcus
e Belutti – Irracional
-Tem
certeza que não queres ir de cadeira? – Léo estava de pé na porta do meu quarto
do hospital, me esperando para irmos ver o Boi.
-Tenho,
amor – ele beijou minha testa. – Será que dá para parares de ser tão
paternalista comigo. Para isso eu já tenho o João – Léo fez com que parasse na
frente dele, erguendo meu rosto.
-Maria
Beatriz... – balançou a cabeça. – Tu não faz ideia de como a última coisa que
quero nesse momento é ser seu pai – me prensou na parede.
-Então me
beija de verdade – ofereci minha boca.
-Esqueceu
que estamos em um hospital e com a porta aberta?
-Por isso
não – o puxei para mim, fechando a porta atrás de nós.
-Tu és
danada, marrentinha – pegou minha nuca juntando nossas bocas com voracidade,
porém perdi o fôlego mais cedo que esperava o empurrando, engasgada. – Pequena,
está tudo bem?
-Está –
comecei a andar de um lado para o outro em busca de ar.
-O médico
disse que isso ainda vai acontecer durante algum tempo.
-Eu sei –
voltei a olhar seu rosto lindo, que sorria, mesmo com o semblante preocupado. –
Desculpa.
-Pelo
quê? Me provocares? – tocou meu rosto e
rimos juntos. – Sabes que o cigarro está eliminado de nossas vidas, não é?
-Sei –
repeti seu gesto com carinho. – Nós prometemos que se um dia fossemos parar, o
faríamos juntos.
-Juntos.
Como tudo na vida – entrelaçamos nossas mãos.
-Sim –
respirei fundo e Léo me deu um selinho.
-Desculpa,
pequena, mas tive tanto medo de te perder que agora penso que vai quebrar.
-Estou
frágil, mas nem tanto, amor. Vou melhorar – disse confiante.
-Já
melhorou, linda. Está até brigando comigo – ri, batendo de leve no seu
braço. – Tua mãe também parou de fumar,
ela te contou?
-Contou.
Depois que o médico saiu ontem. Ela nos surpreendeu, não é, amor?
-Tu que nos
surpreendeste com esse enorme coração, Bia – tocou meu peito. – Nós percebemos
o arrependimento sincero dela, mas era de ti que o perdão tinha que vir e ele veio na mesma
hora – me abraçou quando percebeu que meus olhos estavam cheio de lágrimas.
-Ela é
minha mãe.
-Sim e tu
agora estás completa.
-Só me
falta uma coisa... – Léo olhou confuso –
precisamos acordar o Boi – ele riu fracamente. Ali percebi como Léo sentia
falta do melhor amigo e principalmente, como devia ter sido complicado todos
esses dias comigo em coma também.
-Tu tens
razão. Vamos lá?
-Vamos.
-Sabes que
me arrependo de não ter dito para o Boi te levar de volta à fazenda para cantar
para a Mimosa. Teríamos passado aquela noite rindo, tomando cerveja e
implicando um com o outro, sem nada disso ter nos afetado tanto – Léo disse
pensativo, enquanto caminhávamos devagar até a UTI.
-Mas daí ele não teria conhecido o
amor da vida dele – apontei para Mirela que estava mais adiante.
-Eu iria atrás dela em qualquer
outro lugar, – seus olhos estavam tristes – para que eu pudesse ver vocês dois
bem.
-Eu sei, amor, mas não podemos voltar
atrás e ele vai sair dessa também – apertei ainda mais nossas mãos juntas. –
Será que ele tem noção que vai acordar namorando e já abençoado pela Zefa e o
Padre Olavo? – rimos.
-Acho que é por isso que está
demorando a acordar. Deve estar refletindo na vida.
-Leonardo! – ralhei, ganhando um
beijo na boca.
-Estou brincando, pequena. Ele que
não assuma essa menina que eu o obrigo a casar, igual fez comigo.
-Ele fez isso contigo? – estava
surpresa.
-Depois de tudo que enchi o saco
dele, era o mínimo que podia fazer – coçou a cabeça.
-Ela é uma graça, não é, amor?
-É, mas tímida demais, pequena –
lembrei do dia da boate. – Fiquei sabendo que foste tu que apresentaste os
dois.
-Aprendi contigo que ser amigo
atrapalha na hora de paquerar.
-Me lembro bem desse dia.
-Eu também – ganhei mais um selinho.
-Bom dia, Mirela. – chegamos perto
da nossa nova amiga e quase cunhada de consideração.
-Bom dia, Bia. Fico feliz em te ver
bem – ela me abraçou, emocionada.
-Eu também fico feliz em ver você
aqui. Minha flecha de cupido acertou em cheio, amor – Mirela corou
violentamente.
-Essa minha marrentinha é fogo – Léo
me abraçou por trás, beijando meu ombro. – Tu vais ver, o senhor Luis Carlos
vai levantar rapidinho daquela cama depois da visita da Maria Beatriz. Ela não
vai deixá-lo em paz – bati no seu braço, brincando.
-Vamos entrar? – estava ansiosa.
-Vamos.
-A gente se fala depois, Mirela. Foi
muito bom te ver.
-Tudo bem. Foi bom rever você
também, Bia. Ele vai ficar feliz em ver que foi um herói. – nessa hora me lembrei
novamente do dia da tragédia e que ela estava ao nosso lado.
-Como conseguiu sair?
-Quando o Boi gritou, assustei e me
perdi de vocês . Fui empurrada para
fora, sendo uma das primeiras a sair.
-Que bom. Fico feliz.
-Agora vão, entrem para ele se levantar
também.
-Deixa com a gente – sorrimos e
seguimos até a porta do quarto que nos levaria ao nosso amigo. E foi ali que
minha ficha caiu, principalmente quando, já dentro do UTI, vi Boi naquela cama
cheio de aparelhos.
Era mais difícil que imaginava e entendi
o que Léo tentava me dizer a pouco.
Também caçaria Mirela em qualquer
outro lugar para não ter que estar naquele quarto vendo meu amigo lutando pela
vida.
Nos aproximamos da cama e toquei sua
mão.
-Oi – minha voz saiu embargada e
senti Léo abraçar minha cintura, tentando unir nossas forças com aquele gesto.
– Eu acordei primeiro, viu.
-E eu disse que se isso acontecesse
estarias ferrado – a voz de Léo estava emocionada também.
-Está na hora de acordar, amigo – me
aproximei do seu ouvido. – Preciso te agradecer. Tu salvaste minha vida, Boi.
-Saiba que eu o agradeço todos os
dias – olhei para cima, tocando o rosto dos dois. – É claro, depois de brigar
com ele.
-Claro – revirei os olhos, sorrindo.
– Boi, que história é essa de deixar a menina que te ajudei a conquistar solta
por aí?
-Disse para ele que ela vai cansar
de esperar – fungou.
-Ela vai fugir isso sim e se prepare
– sussurrei ainda abaixada perto do meu amigo – sua mãe e o padre Olavo já
abençoaram vocês dois. E lembra o que aconteceu comigo e com seu amigo aqui.
-Tem jeito mais não. Até o pai da
menina veio te visitar, ou ver se não tinha como fugir. Se for por isso que
estás dormindo ainda, trate de acordar – Léo brincou.
-Viu só, não tem mais jeito de
escapar, peão. – respirei cansada.
-Cara, vou levar minha garota de
volta para o quarto. E preciso te contar, - levantei e foi a vez de Léo
sussurrar no ouvido do seu irmão de uma vida inteira – acabou de acordar e já
está me dando trabalho – sorri, balançando a cabeça – Vamos?
-Sim.
Nos despedimos do nosso amigo e
voltamos para meu quarto, dessa vez de cadeira de rodas. Descansei o resto do
dia com Léo dizendo que deveria ter sido menos teimosa. Ali percebi que
estávamos voltando ao normal, até em nossas brigas que amava tanto.
Completado um mês da tragédia,
recebi alta. E enquanto minha mãe arrumava minha mala, assistia ela e João
discutirem comigo.
-Filha, a igreja vai estar lotada.
-Pai, nós vamos chegar quase no fim.
Podemos ficar na capela – implorava para ir à missa de um mês da tragédia na
igreja do Padre Olavo.
-E você não diz nada? – Maria Elisa
perguntou para Leonardo, que estava refestelado no sofá junto comigo, fazendo
cafuné em meus cabelos.
-Olha, Dona Maria Elisa, - ele
gostava de provocar a mãe, fazendo com que eu e João gargalhássemos todas às
vezes – conheço essa marrenta aqui a bem menos tempo que vocês, tchê. Por isso sei que não adianta
discutir com a bichinha – me apertou ainda mais a ele.
-Bia, a imprensa do mundo inteiro
está na cidade ainda.
-Pai, cinco minutos. Eu quero rezar
por nossos amigos – senti meu coração apertar lembrando todos aqueles que nós
conhecíamos de vista, mas principalmente de Mauricio e Vinicius, meus colegas
de classe, que morreram naquele dia. – Ainda não consigo acreditar que o
Mauricio e o... – comecei a chorar sendo acalentada por eles.
-E a galera da agronomia, então.
Porra! Desculpa, Delegado, mas é difícil perder amigos tão queridos.
-Vai ser complicado para vocês terem
que conviver com essa tragédia daqui para frente, principalmente tendo feito parte
integrante dela, por isso queremos preservá-los, filha – minha mãe disse
carinhosa. – Têm fotos de vocês espalhadas por todos os cantos.
-Até a última que a Bia mandou para
ti.
-Essa o senhor tinha que investigar
– Léo se remexeu ao meu lado. – Queria saber como uma foto que estava no meu
celular foi parar na imprensa.
-Deixa para lá, amor. O pai já tem
tanta coisa na cabeça.
-Deve ter sido uma das vezes que
abriu para alguém aqui no hospital, Léo.
-Pode ser – mas conhecia meu
namorado e ele não tinha engolido essa história.
-Podemos ir então? – pedi juntando
as mãos.
-Tem outro jeito? – beijei meu
namorado.
-Não – dei de ombros.
-Léo entra com ela pela casa do
Padre Olavo e fiquem na capela, atrás do altar.
-Pode deixar, Seu João.
-Vamos estar no carro de trás.
-Ok, dona Maria Elisa.
-Sem o dona, Leonardo, quantas vezes
eu já te disse... – rimos e saímos os
quatro do hospital.
O sol estava a pino como há um ano,
o dia da minha chegada a Santa Maria. Não sei se Léo recordava dessa data e
isso não me importava, por saber que homem não ligava muito para essas coisas.
Porém nunca poderia esquecer o dia em que conheci, ou melhor, dizendo,
atropelei o amor da minha vida.
O dia mais feliz da minha vida.
O caminho até a igreja foi feito em
um silêncio harmonioso, pois Léo sabia que eu estava adaptando meus olhos para
a vida, depois de um mês inteiro dentro do hospital, depois de quase morrido.
Chegando lá, como instruído por
João, ele entrou pelos fundos da igreja, ajudando-me a descer e chegar até a
sacristia.
-Está tudo bem, pequena? – perguntou
preocupado quando respirei fundo.
-Está, amor – toquei seu rosto,
carinhosamente. – Só um pouco cansada.
-Quer voltar?
-Não. Vamos ficar só um pouquinho.
-Tudo bem, vem devagar. – Léo me
levou até a capela e de lá podemos observar a igreja cheia, principalmente do
lado de fora, com toda a imprensa ali.
Assistimos a benção final feita pelo
Padre Olavo e aquelas palavras me emocionaram muito, mesmo começando a passar
mal devido a quantidade de pessoas ao nosso redor. Acho que nunca mais
conseguiria ficar em lugar fechado.
-Me dá uma dor no coração, amor,
olhe aquelas mães – apontei. – Poderia ter sido a gente – solucei e ele me
abraçou. – É uma sensação horrível.
-Eu sei, pequena – senti seu corpo
estremecer também. – Shiu. Vai
passar.
-Como pode ter acontecido isso com a
gente?
-Não sei, pequena, ainda estão
investigando.
-Filhos – Padre Olavo passou pela
capela, nos vendo ali abraçados.
-Padre – me desvencilhei dos braços
de Léo, indo a sua direção.
-Minha filha – abraçou-me, também
emocionado. – Iria a tua casa hoje à noite.
-Eu quis vir, Padre – funguei.
-Eu sei, minha querida. Mas não pode
se esforçar.
-Foi o que dissemos – olhamos para
Léo.
-Vou ficar bem – estiquei a mão para
que meu namorado pegasse.
-Vou dar atenção a algumas famílias,
mas me espere que a noite estarei lá, Maria Beatriz – assenti e voltei para os
braços de Léo.
-Até mais, Padre.
-Cuide dela, filho.
-Eu vou – ele beijou minha testa e
saiu. – Bia, antes de irmos embora queria te dizer uma coisa – olhei confusa
para seu rosto. – Algo que deveria ter feito há um mês.
-O que foi, Léo?
-Pequena, tu és a coisa mais
especial da minha vida. Não, - balançou a cabeça - tu és a minha vida e percebi
isso no momento em que te vi desfalecer nos meus braços sem que eu pudesse
fazer nada. Naquele momento, Maria Beatriz, eu quis morrer, só para poder ficar
perto de ti, voltando a respirar apenas quando o médico disse que tu estavas
fora de perigo.
-Léo...
-Shiu
– ele sorriu, tocando meus lábios com seu dedo. – Hoje é um dia muito especial
para nós, amor – ele lembrou. Sorri, deitando a cabeça em sua mão. – Um ano que
me atropelaste naquele aeroporto.
-Que nos atropelamos você quer dizer
– as lágrimas recomeçaram a cair quando ele assentiu.
-A gente aprendeu que Deus escreve
certo por linhas tortas, não é? Então acho que o dia teria que ser esse – Léo
se ajoelhou diante de mim. – Fiz uma promessa aos pés do altar dessa igreja bem
antes de toda essa tragédia e lá já pedi para que ficastes boa e hoje vendo que
fui prontamente atendido, venho aqui cumpri-la, além de lhe fazer um pedido –
respirei fundo. - Maria Beatriz Albuquerque, minha pequena marrenta – solucei
extasiada. – Tu aceitas se casar comigo?
Estava sem fala, sentindo que minha
respiração falharia a qualquer momento. Meu Deus! Era tudo que eu mais queria.
Ser dele, para sempre.
-Léo... – me ajoelhei também,
enquadrando seu rosto com minhas mãos. – Eu te amo tanto. Tu também és minha
vida e tive a mesma sensação quando acordei do coma e não te vi ao meu lado.
Quero ser sua para sempre – sorri em meio ao choro. - Sim, Leonardo Ávila, eu
aceito me casar contigo – Léo beijou meus lábios levemente e nossos gostos
salgados se misturaram ali, me fazendo perceber que não era a única que
chorava.
-Sempre estarei aqui por ti.
-Eu sei – solucei. – E é isso que eu
mais quero.
-Eu sei – repetiu sorrindo, me
beijando novamente. Um beijou que deveria ser proibido em uma sacristia, mas
quem se importava. Agarrei sua nuca, ali ajoelhada, me sentindo viva e completa
para ser feliz ao lado do meu amor.
-Eu te amo – disse perdendo o ar,
sendo levantada por ele.
-Eu também, mais que tudo, pequena.
Quero me casar contigo. Ter teu corpo colado ao meu todas as noites, – me
abraçou – poder sentir sua respiração em meu peito todas as manhãs – beijou
meus cabelos – Comprar nossa casa, construir nossa vida.
-Nós temos uma casa, Léo – beijei
seu pescoço.
-A nossa cabana.
-É – tocou meu rosto com o polegar.
-Mas eu quero te dar mais, pequena.
Quem sabe um apartamento.
-E o nosso lugar? – fiz biquinho.
-Ele será nosso, para sempre.
-Nossa casa de final de semana?
-E para quando quisermos variar –
piscou sacana.
-Leonardo! – ralhei - Estamos em uma
igreja.
-Por isso vejo que já é hora de
irmos embora.
-Também acho, senhor meu noivo – ele
me pegou no colo, girando nossos corpos. – Para, Léo, vou perder o ar – logo
fui colocada no chão.
-Tu estás bem? – me sacudiu.
-Estou – sorri – e o beijei
levemente. – Vamos que o senhor tem uma missão agora – o puxei.
-O quê?
-Pedir minha mão para meu pai e
minha mãe.
-Isso vai ser moleza, principalmente
para a Dona Maria – rimos, entrelaçando nossas mãos. Mas quando estávamos
próximos do carro, João nos gritou, pedindo para esperar.
-Você precisa voltar para o
hospital, Léo.
-O que aconteceu, pai? – senti meu
corpo inteiro gelar.
-O Boi acordou.
Naquele momento nossa alegria estava
completa.
Adorei! Completamente apaixonada por este casal! ;)
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